sexta-feira, 1 de junho de 2012

MARCHA DAS VADIAS

Antes de começar o meu texto eu gostaria de esclarecer certos pontos que eu pediria que não saíssem do pensamento dos amigos que se aventurarem a ler.

1. NENHUM homem, mas NENHUM MESMO, tem o mínimo direito de abusar de uma mulher.
1.1. Entenda-se por abuso as abordagens sexuais não autorizadas.
1.1.1. Autorizada vale (quase) tudo (afinal, quem sou eu pra dizer que certas coisas que aparecem na revista NOVA não funcionam?).

Ok, tendo dito isto, comecemos.

"A Marcha das Vadias é um movimento internacional de mulheres criado em abril de 2011 na cidade de Toronto, no Canadá, em resposta ao comentário de um policial que disse que, para evitar estupros no campus, as mulheres deveriam parar de se vestir como “sluts” (vadias, em português)." [LEIA AQUI]

As palavras do tal policial são algo que, sem sombra de dúvida, merece o repúdio de toda a sociedade. Eu gostaria de crer que estamos todos de acordo com a ideia de que quem causa o estupro é o homem e não a mulher, pouco importando se ela está nua ou de burca. E é isto que deve ser posto em questão. O meu ponto é: tenho visto muitas moças por aí que, por mais bem-intencionadas que elas estejam na defesa de seus direitos, andam confundindo um pouco a razão de tal defesa. Como?

"Mulheres ofendidas contam o que acontece quando os homens pensam que a roupa é um convite" [LEIA AQUI]

 A reportagem cita vários exemplos, alguns casos de violência e, só a constar, ocorreram inclusive em lugares ditos "civilizados" como Paris, mas esta foi a menor parte da matéria. O foco era a "confusão" que uma roupa pode causar em interpretações alheias. A entrevistada principal, Simone Grazielle, produtora de eventos, fora confundida com uma prostituta em um desses eventos (compreenda-se "casa noturna/boate paulistana altas horas da noite") por estar vestindo short e bota e por ter "caprichado na maquiagem". Estejam os ainda leitores atentos ao fato de que ela foi apenas ABORDADA. Não foi agredida nem estuprada. Ela se ofendeu simplesmente por ter sido confundida com uma trabalhadora de um setor que não era o dela. Sim, por menos que algumas pessoas gostem ou reconheçam isso, prostitutas são trabalhadoras e o tipo de roupas e maquiagem que elas usam são como seus uniformes de trabalho, permitindo que elas sejam reconhecidas como profissionais. Aí eu pergunto: "Se ela fosse uma prostituta, ela poderia ser abordada?" Claro que sim! E o possível cliente DEVE perguntar quanto é o programa. O que ele não pode é achar que, por ela ser uma prostituta, ela seja automaticamente obrigada a ter sexo com ele. Uma premissa simples em qualquer tipo de prestação de serviços: o prestador só é obrigado após o contrato ser firmado e estabelecido. Simples assim. Prostitutas não merecem ser tratadas com respeito por serem mulheres. Merecem ser tratadas com respeito por serem PESSOAS.

 Retomando o ponto "as roupas"... Ser confundido com outra coisa por conta dos trajes... quantas vezes eu já não vi ou mesmo aconteceu comigo. Punks sendo confundidos com mendigos; gente de branco sendo confundida com médico... recentemente, no Recife, eu estava em uma loja em um shopping com um amigo e uma moça veio me perguntar o preço de um determinado item. Ora, como eu saberia? Mas eu fui olhar um dos funcionários o estabelecimento e lá estava ele de camisa cinza de botões, calça azul marinho e sapato preto. Bom, minha calça era jeans, mas eu não poderia culpar ninguém pela confusão ou mesmo me sentir ofendido, eu estava "uniformizado" no ambiente de trabalho alheio, o que me move a perguntar: Qual é a real ofensa em, não havendo nenhum tipo de agressão, ser confundida com uma prostituta?

 Outro ponto no qual discordo de algumas das motivações de algumas apoiadoras da Marcha é: O que diabos e uma "vadia"? Não vou dar uma de inocente e fingir que não sei, mas esta é a questão a ser aprofundada. Um cara usa um termo idiota, falemos deste termo. "Slut", que não significa "vadia", mas que em sua origem etimológica tem mais a ver com "suja". A tradução do termo por "vadia" se deu obviamente pela conotação sexual depreciativa ser similar. Em nossa (ocidental, pelo menos) linguagem machista, "sujeira" e "ócio", no que se referem às mulheres têm uma ligação com "sexo". Não vou tentar mudar o nome da Marcha, não é isso. Apenas acho um tanto estranho. Soa para mim como se o movimento negro resolvesse fazer a "marcha dos macacos" ou os gays a "marcha das bichas (ou "dos viados")" ao invés de suas manifestações serem pelo uso correto de termos que não firam a dignidade do que representam. Quando eu vejo uma mulher dizendo, ainda que em uma postura da linha "a melhor defesa é o ataque", "somos todos vadias", eu penso: "será que ela se acha realmente superior a alguma outra moça que tenha optado por ser mais livre sexualmente?". Eu não sei, não apenas questionamentos.

 Mais um ponto atinge diretamente essas moças que têm uma relação mais solta com o sexo. Pessoal, não vamos esquecer uma coisa fundamental aqui: ROUPAS COMUNICAM SIM! Quando nos vestimos de determinados modos estamos dizendo um pouco de quem somos, de nossas preferências, de nossa "tribo". Sabemos quando vemos um rockeiro, um funkeiro, um pagodeiro, um "mauricinho", um "playboy" e por aí vai... E o que nós temos a ver com o modo como as outras pessoas se vestem? Errou que respondeu "NADA"... e também acertou. Nós buscamos identificação com o nosso jeito, mas se não há essa identificação, aí sim não teremos nada a ver com isso. E há moças que gostam de expressar sua liberalidade sexual através de suas vestes e ELAS TÊM TODO O DIREITO DISSO. Eu posso achar um pouco demasiado, posso achar que "ela não é moça pra mim". O que eu não posso achar é que 1. ela é uma "vadia" e 2. que ela ser assim me dá direitos automáticos de abordá-la com contatos sexuais sem a sua permissão. E eu tampouco posso achar que ela não deva se vestir assim... e vem a questão: Os homens devem permanecer totalmente anestesiados a uma mulher que se vestiu PARA FICAR BONITA/SEXY? Cobiçar uma mulher se tornou o grande pecado ao feminismo de hoje? Na mesma matéria citada anteriormente: " 'Será que se eu transar no primeiro encontro ele vai me achar uma ‘vadia’? E se eu vestir uma calcinha fio dental, ele vai pensar que sou dada?' " Estas são dúvidas femininas? Ou são dúvidas de mulheres que se preocupam demais com o que homens machistas pensam? E, repito, qual o real problema em ser mais "proativa sexualmente" (o eufemismo aqui foi inevitável, perdão) e querer e gostar de expressar isso inclusive com suas roupas? Devemos nós (homens) nunca mais repararmos em vocês?

 Por fim, eu apenas gostaria de dizer que acho a manifestação e o modo como ela é feito muito válida. Quando uma mulher sai sem camisa ela mostra que o mostrar ou não do corpo é menos que uma questão de "tabu social": é somente uma questão de CONTEXTO, e é em nome desde contexto que eu peço que algumas revejam suas motivações particulares sem perderem o ímpeto da manifestação e da busca pela igualdade e de exporem como certos julgamentos podem efetivamente ferir as pessoas e até matá-las, literalmente.

 Não, minhas queridas amigas, vocês não são vadias e nem as "vadias" são vadias. Assim como eu não sou um macaco por ser negro. Assim como um homossexual não é uma bicha. O nome da passeata não me choca, apenas me confunde.

Um beijo deste aqui que tanto ama as mulheres.

Pode começar o apedrejamento.

Nenhum comentário: