domingo, 2 de fevereiro de 2014

QUOTIDIE

Segundo vários dicionários, um momento pode ser um pequeno intervalo de tempo, de pouca duração, um instante, o tempo em que algo acontece, oportunidade, circunstância, peso, valor, importância. O mais importante é que é um substantivo abstrato e muitas vezes os critérios de avaliação do abstrato passam pelo subjetivo. O momento dura enquanto eu achar que ele ainda não terminou.

Desses momentos, que duram o quanto lhes for cabido durar, tenho três preferenciais na vida quotidiana feminina. Certo, não são momentos meus, mas acabam se tornando. E são momentos triviais, que não se dá muita importância a eles e que inclusive, se perguntadas, elas dirão que não gostam deles.

O primeiro deles é quando ela acorda. Não, não é quando ela dá um pulo desesperadaatrasadaparaotrabalho. É o exato instante em que ela, ainda deitada, cabeça no travesseiro, abre os olhos. Sempre é bonito. Ver isso é fazer qualquer dia começar bem.

O segundo é o momento em que ela sai do banho. Basta isso. Ainda enrolada na toalha, cabelos molhados, ainda com algumas gotas sobre os ombros. Quase um nascimento. Quase um batismo. Sempre uma renovação. Ver isso é conhecer a sensação de estar em casa.

O terceiro momento é na verdade um processo. É quando ela se arruma. Quando ela, sempre ritualisticamente, busca se fazer mais bonita do que já é. Pentes, cremes, maquiagens, batom. Vestido, acessórios, sapatos. Espelho, espelho, espelho. Está bom? Ficou bom? Ficou como o imaginado e esperado? Falta algo? E se mudar isto ou aquilo? Espelho, espelho dela. E meus olhos timidamente extasiados contemplando cada gesto, pincelada, retoque, ajeitada, conferida. Ver isso é presenciar a encarnação das musas.

São momentos muitas vezes corriqueiros, comuns, às vezes até automáticos, mas são delas e ver isso tudo acontecer é fazer parte de sua vida e intimidade.

Outro dia, há poucos dias, ela, inadvertidamente, se arrumou em minha presença. Eu era só um convidado. Eu usei tudo o que eu tinha de razão em mim para não me descuidar e acabar invadindo a sua privacidade, mas sei que não fui completamente eficaz. Temi. Certamente ficaria em babulcios se questionado por que olhava daquele modo. Sem malícias, mas como explicar a essa altura o olhar que não era mais que encantado? Durante o resto da noite inteira eu a vi linda como nunca vira antes. Possivelmente a impressão se dera simplesmente por eu ter visto acontecer e ter aquele momento. A beleza não era o resultado, nem o processo. Era eu ter podido estar lá.

E o sorriso dela ao dizer “estou pronta, vamos?”.

Me recomponho. Respiro fundo. É o único momento que tenho.

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Alice perguntou ao coelho quanto tempo durava “para sempre”, ao que este lhe respondeu que às vezes durava apenas um segundo.

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